sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

A atitude filosófica: Thauma, questionamento e reflexão filosófica.

 
Segundo Aristóteles a filosofia tem sua origem e sua raiz no espanto (thauma) que provém de uma dificuldade inicial - aporia - que é provocada pelo fato de existirem argumentos em conflitos. 


Este estado inicial de ignorância, comparado por Aristóteles a um homem acorrentado (Metafísica, 995a), dá lugar a um sentido posterior à aporia que se torna agora diaporia, exploração de vários caminhos, exploração que se mostra como um processo dialético.

 A estas aporias é buscada e apresentada uma solução - euporia ou lysis - que literalmente significa "libertação" - mantendo a metáfora do acorrentar. 

Segundo Aristóteles, o apresentar e o elaborar de uma questão, conduzindo à solução, cerne do método filosófico, é uma tarefa difícil e árdua (Metafísica, 995a).

Questionar é investigar, abrir espaços seguindo vestígios. A filosofia nasce de uma necessidade radical de conhecimento. É uma atividade teórica. Filosofar é teorizar. Como entender esse teorizar?

Theoria - para os gregos - tem por raiz um termo que designa a visão. A partir do momento em que tentamos ver em nós mesmos o que experienciamos, surgem em nós representações que são acessíveis à linguagem. 

Na verdade, uma experiência como vivido puro que renuncie a qualquer esforço de expressão não passa de um mito, aliás alimentado por muitos quando se afirmam incapazes de exprimir sua experiência em uma linguagem e reiteram o seu caráter inefável.

A 'teoria" não é qualquer visão. Ao tentar descobrir a realidade o homem a enfrenta como uma aporia. E esta provoca o espanto.
 "Espantar-se - diz Sócrates no Teeteto - a filosofia não tem outra origem" (l55d). O thaumadzein, o espantar-se, testemunha a mudança, a transformação que se opera em relação ao mito. 

Neste o thauma é o objeto do espanto, da admiração; o efeito por ele produzido é o sinal, nele, da presença do sobrenatural. Quando para os seus antecessores a estranheza de um fenômeno impunha o sentimento do divino, para os Milésios a estranheza se propunha aos espíritos como aporía, como uma questão.

 O insólito e o estranho não fascinam mais a inteligência mas a mobilizam. Há como uma transformação: o espanto, como veneração se transforma em questionamento. Ao ser reintegrado, na ordem da natureza, o thauma, ou aquilo que resta de "maravilhoso", é, ao término da investigação, a engenhosidade da solução encontrada e proposta.

Estranhamento não é simples assombro, surpresa. Estranhar-se perante algo, perante as coisas é estranhar-se delas, fazer-se estranho a elas. Na atitude natural há um contato ingênuo com as coisas; não há verdadeiros problemas, não há aporia, tudo parece familiar, evidente, inquestionável. 

Na estranheza ocorre a ruptura, e o trato habitual com as coisas é rompido. Ao nos surpreendermos, percebemos logo que as coisas são estranhas a nós e nós a elas. Estranhos no sentido de diferentes, outros; separamo-nos delas. Na estranheza desvelamos o que a familiaridade encobria. 

Deste contraste entre o familiar e o estranho surge a questão. Na passagem da atitude natural cotidiana, onde nada é problemático, à atitude teórica ocorre, e mais, é necessária uma torção, uma conversão que desliga o indivíduo do comércio ingênuo com as coisas. Da atitude natural à atitude teórica filosófica ocorre a conversão. Esta conversão é a separação em relação ao que precede e adesão ou enfrentamento do que vem.

Isso não basta. É necessário que o homem se estranhe também, vale dizer, volte-se para si próprio e coloque para si as questões que descobre em seu estranhamento. A reflexão é, pois, outra etapa da teorização. Questionar é tarefa do pensamento. E o pensamento é uma atividade mental "que nada condiciona" (Arendt, 1978: p.70).



Resultado de imagem para hora da tarefa escolar

ATIVIDADES NO CADERNO:

1. Segundo Aristóteles, onde a filosofia tem sua origem?

2. O espanto provém de uma dificuldade inicial, e porque é provocada? 

3. O que significa a solução - euporia ou lysis?

4. O que é o thauma?

5. É necessário que o homem se estranhe também. Como fazer isso?












Trecho de http://www.fae.unicamp.br/vonzuben/fileduc.html
Publicado em Pro-Posições,  Revista da Faculdade de Educação da UNICAMP. vol.3 no.2(8). Julho 1992.

© Newton Aquiles von Zuben
Doutor em Filosofia - Université de Louvain
Professor Titular - Faculdade de Educação da UNICAMP
E-mail: navzuben@obelix.unicamp.br

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